
GISELLE LUCENA
Os últimos meses do ano chegam ao Acre trazendo chuva: o rio se alarga, as folhas revigoram suas cores e o chão de terra vira barro por onde deslizam pequenos fios de água doce. Para entrar no Centro Cultural Vivarte, por exemplo, lá no bairro Vila Ivonete, por trás da folhagem poderosa, composta pelas Folhas Rainha e Cipó Jagube, não se pode ter medo da natureza, é preciso, apenas, respeito e adaptação: afastar um galho aqui, desviar de um outro ali e, na porta, tirar os sapatos – este último, nada mais que um costume local.

Centro Cultural também é casa e galpão de ensaios
E numa tarde qualquer, debaixo de chuva fina, num dia de meio de semana, o centro recebe a visita do secretário de cultura da cidade e também historiador, Marcos Vinícius Neves. Ele foi conversar sobre o roteiro da apresentação do grupo Vivarte em solenidade do município e acompanhar o ensaio final. Antes de sair, os artistas não deixam de perguntar sobre o Fundo de Cultura, e então, o presidente da Fundação Garibaldi Brasil se distancia do papel de historiador e os lembra do Fórum marcado para a noite daquele mesmo dia. Mas, infelizmente, os artistas do grupo Vivarte não confirmaram presença, pois naquela noite, além de aproveitar o máximo a presença do dramaturgo Edmilson Santini eles tinham outras visitas a receber: a atriz e contadora de histórias Karla Martins e o artista plástico Darcy Seles. E a dramaturgia continuava como mote para os encontros.
Espaço permanece aberto para visitas, práticas e debates sobre cultura, dramaturgia, história...
No Centro Cultural que também é casa e galpão de ensaios, a discussão é diária. O grupo que vive da/e para as artes é, também, um grupo de irmãos-amigos, seres humanos que também se cansam de si e destoam mentes e quereres: o espaço é pequeno, o tempo é curto, as idéias são muitas e os obstáculos da vivência cotidiana são desafiadores (ou tem ensaio do novo espetáculo ou tem oficina de Maracatu). E assim, os roteiros, as histórias, os enredos e as políticas culturais vão sendo construídas e vividas.
Teatro de Rua e da Floresta

Dramaturgo e cordelista Edmilson Santini escreveu texto de acordo com as experiências, dele e do Vivarte, com a cultura popular

Animais da floresta sempre estão presentes nas histórias do grupo
ENCANTORIA – “O texto foi construído com base nas histórias das nossas andanças e na experiência dele com a cultura popular”, explica Maria Rita. O “Encantoria” é uma viagem na história do país por meio da cultura popular: um grupo de brincantes vai atravessar a noite da floresta e recebe uma visita inesperada e passa a viver uma realidade mágica. Várias histórias surgem e os brincantes viram personagens: onça, uirapuru, índia, caipora... “Tudo nessa história conta com a mitologia da floresta”, garante Santini, autor do texto.
Outros Olhares - “Karla Martins achou o roteiro complexo, mas elogiou o texto e o arranjo musical”, orgulha-se Rita. “Este novo espetáculo é um grande desafio para nós, por isso, precisamos nos debruçar muito para que fique bom”, conta. Segundo a diretora, o grupo planeja chamar outras pessoas da área para assistir aos ensaios e levar outros olhares à construção. Ela reconhece o valor da interação entre os artistas para este processo. “É muito importante contar com a experiência de quem atuou durante muito tempo com teatro de rua. Observar e conhecer os trabalhos e a atuação de Karla Martins e Ivan de Castela, por exemplo, é fazer escola. Eles são grandes referências”, diz. “Propomos fazer um teatro experimental de rua e de floresta, temos que fazer internamente depois ir pra rua”, completa.
Neste ano, o grupo foi um dos contemplados com o Prêmio Matias de Cultura Popular, com um projeto de ampliação do galpão de ensaios da casa que, segundo a diretora, “está sempre cheia”. Nesse sentido, Maria Rita avalia de forma positiva a atuação do grupo durante o ano de 2010. “Foi um ano de o Vivarte mostrar que está aos poucos achando o seu caminho, sua linguagem etc.” No próximo dia 30, a casa vai receber o grupo Majericão, de Porto Alegre. “Estamos planejando uma viagem a uma comunidade ribeirinha”, revela Rita.

Seis artistas compõem o elenco do novo espetáculo
Além da finalização e circulação do novo espetáculo, também está nos planos do Vivarte, a compra de equipamentos para realização de oficinas e ensaios do espetáculo “Manuela e o Boto”, que será remontado. “Os ensaios serão abertos e acontecerão nas praças, juntamente com as oficinas de teatro de rua e maracatu”, explica a diretor. Outro espetáculo que ainda está em cartaz é “O Casamento da Filha de Mapinguari”. O grupo dá continuidade à turnê de circulação que o levou para várias escolas públicas da cidade e zona rural, como o CERB e a Escola da Floresta, com patrocínio da Caixa Econômica Federal.
Oficinas de Percussão – Um dos projetos oferecidos pelo centro são as atividades das oficinas de percussão, ministrada por Lua Azevedo. O projeto, realizado com recursos da Lei Municipal de Incentivo à Cultura e patrocinado pela Uninorte, possibilitou a formação do grupo “Nação Arco-Íris”, com 15 de crianças, entre quatro e 16 anos. Os ensaios acontecem duas vezes na semana e englobam dos ritmos de maracatu, coco, ciranda, entre outros.